Dissolução De Cooperativas: Para Onde Vai O Patrimônio?
As cooperativas são organizações singulares, com uma estrutura e funcionamento distintos das empresas tradicionais. Uma das características mais marcantes é a forma como o capital é constituído: por meio das cotas-parte adquiridas pelos sócios. Mas o que acontece com o patrimônio da cooperativa em caso de dissolução? Para onde vai esse montante? Essa é uma dúvida comum, e a resposta é crucial para entender a essência do cooperativismo. Neste artigo, vamos desmistificar esse processo e explicar detalhadamente o destino do patrimônio cooperativo em situações de dissolução.
O que são Cooperativas e como Funcionam?
Para entendermos o destino do patrimônio em caso de dissolução, é fundamental compreendermos o que são cooperativas e como elas operam. Cooperativas são associações autônomas de pessoas que se unem voluntariamente para satisfazer suas necessidades e aspirações econômicas, sociais e culturais em comum, por meio de uma empresa de propriedade conjunta e democraticamente controlada. Essa definição, estabelecida pela Aliança Cooperativa Internacional (ACI), já nos dá uma boa ideia da essência do cooperativismo.
No Brasil, a Lei nº 5.764/71 define a Política Nacional de Cooperativismo e institui o regime jurídico das sociedades cooperativas. Segundo essa lei, as cooperativas são sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados. Ou seja, o foco principal de uma cooperativa não é o lucro, mas sim o atendimento das necessidades dos seus membros.
O funcionamento de uma cooperativa é baseado em princípios universais do cooperativismo, que incluem:
- Adesão voluntária e livre: Qualquer pessoa pode se associar a uma cooperativa, desde que compartilhe dos seus objetivos e esteja disposta a cumprir com as responsabilidades.
- Gestão democrática pelos membros: As decisões são tomadas em assembleias, onde cada membro tem direito a um voto, independentemente do seu capital investido.
- Participação econômica dos membros: Os membros contribuem para o capital da cooperativa e participam dos resultados, de forma proporcional à sua participação nas atividades da cooperativa.
- Autonomia e independência: As cooperativas são organizações autônomas, controladas pelos seus membros.
- Educação, formação e informação: As cooperativas investem na educação e formação dos seus membros e colaboradores, para que possam participar ativamente da gestão da cooperativa.
- Intercooperação: As cooperativas colaboram entre si, para fortalecer o movimento cooperativista.
- Interesse pela comunidade: As cooperativas se preocupam com o desenvolvimento da comunidade onde estão inseridas.
Uma das características distintivas das cooperativas é a sua estrutura de capital. Ao contrário das empresas tradicionais, onde o capital é formado por ações, nas cooperativas o capital é constituído pelas cotas-parte adquiridas pelos sócios. Essas cotas representam a participação de cada membro no capital social da cooperativa.
Cotas-Parte: O Coração do Capital Cooperativo
As cotas-parte são, portanto, a unidade de capital de uma cooperativa. Ao ingressar na cooperativa, o membro adquire um número determinado de cotas, que representam sua participação no capital social. O valor da cota-parte é definido no estatuto social da cooperativa, e pode variar de acordo com o tipo de cooperativa e suas atividades.
É importante ressaltar que as cotas-parte não são ações. Elas não conferem ao sócio os mesmos direitos que as ações em uma empresa tradicional. Por exemplo, as cotas-parte não são livremente negociáveis no mercado financeiro. Elas só podem ser transferidas para outros membros da cooperativa, ou devolvidas à cooperativa em caso de desligamento do sócio.
A remuneração das cotas-parte também é diferente da remuneração das ações. Nas empresas tradicionais, os acionistas recebem dividendos, que são uma parcela dos lucros da empresa. Nas cooperativas, os membros podem receber juros sobre o capital integralizado, que são limitados por lei, e também podem participar das sobras, que são os resultados positivos da cooperativa, distribuídos de forma proporcional à sua participação nas atividades da cooperativa.
Entender a natureza das cotas-parte é fundamental para compreendermos o destino do patrimônio da cooperativa em caso de dissolução. Afinal, as cotas-parte representam o investimento dos sócios na cooperativa, e é natural que eles queiram saber o que acontece com esse investimento em caso de encerramento das atividades.
Dissolução da Cooperativa: Causas e Processo
Assim como qualquer outra organização, uma cooperativa pode ser dissolvida. A dissolução é o processo de encerramento das atividades da cooperativa, que envolve a liquidação do seu patrimônio e a destinação dos recursos remanescentes.
As causas da dissolução de uma cooperativa podem ser diversas, e estão previstas na Lei nº 5.764/71 e no estatuto social da cooperativa. As principais causas são:
- Vontade unânime dos sócios: Se todos os sócios concordarem em dissolver a cooperativa, a dissolução pode ser realizada.
- Redução do número mínimo de sócios: A lei estabelece um número mínimo de sócios para a constituição de uma cooperativa. Se esse número for reduzido e não for recomposto no prazo estabelecido, a cooperativa pode ser dissolvida.
- Impossibilidade de atingir os objetivos: Se a cooperativa não conseguir atingir os objetivos para os quais foi criada, a dissolução pode ser uma alternativa.
- Falta de condições para continuar funcionando: Se a cooperativa enfrentar dificuldades financeiras ou operacionais que inviabilizem a sua continuidade, a dissolução pode ser a solução.
- Incorporação ou fusão com outra cooperativa: Se a cooperativa for incorporada ou se fundir com outra cooperativa, ela será dissolvida.
- Declaração de insolvência: Se a cooperativa for declarada insolvente, ela será dissolvida.
O processo de dissolução de uma cooperativa é complexo e envolve diversas etapas. A primeira etapa é a convocação de uma Assembleia Geral Extraordinária (AGE) para deliberar sobre a dissolução. Se a maioria dos sócios presentes na AGE aprovar a dissolução, é nomeado um liquidante, que será responsável por conduzir o processo de liquidação.
O liquidante tem a responsabilidade de realizar um inventário dos bens e dívidas da cooperativa, vender os bens, quitar as dívidas e elaborar um balanço final de liquidação. Esse balanço final deve ser aprovado em Assembleia Geral, e é a partir dele que se define o destino do patrimônio remanescente da cooperativa.
Liquidação do Patrimônio: O Que Acontece com os Ativos e Passivos?
A liquidação do patrimônio é uma etapa crucial do processo de dissolução. É nessa fase que os ativos da cooperativa são convertidos em dinheiro, para que as dívidas possam ser pagas. O liquidante é o responsável por conduzir esse processo, buscando sempre a melhor forma de alienar os bens da cooperativa, para maximizar o valor arrecadado.
Os ativos da cooperativa podem incluir imóveis, veículos, equipamentos, estoques, créditos a receber, entre outros. A venda desses ativos pode ser realizada por meio de leilões, vendas diretas ou outras modalidades, sempre buscando a melhor oportunidade de negócio.
Após a venda dos ativos, o liquidante deve utilizar o dinheiro arrecadado para quitar as dívidas da cooperativa. As dívidas podem incluir obrigações trabalhistas, tributárias, com fornecedores, com instituições financeiras, entre outras. A ordem de pagamento das dívidas é estabelecida por lei, e geralmente prioriza as obrigações trabalhistas e tributárias.
Se, após o pagamento de todas as dívidas, ainda restar algum patrimônio, esse valor será considerado patrimônio remanescente, e será destinado de acordo com as regras estabelecidas na legislação e no estatuto social da cooperativa.
Destino do Patrimônio Remanescente: Para Onde Vai o Dinheiro?
A grande questão que surge quando se fala em dissolução de cooperativa é: para onde vai o patrimônio remanescente? Afinal, depois de pagar todas as dívidas, o que acontece com o dinheiro que sobra?
A resposta para essa pergunta é fundamental para entendermos a essência do cooperativismo. Ao contrário das empresas tradicionais, onde o lucro é o objetivo principal, nas cooperativas o foco é o atendimento das necessidades dos membros. Por isso, a destinação do patrimônio remanescente em caso de dissolução segue uma lógica diferente.
A Lei é Clara: Não Há Distribuição Igualitária Entre os Sócios
A legislação cooperativista brasileira, em especial a Lei nº 5.764/71, é clara quanto ao destino do patrimônio remanescente em caso de dissolução de cooperativa. Não há previsão legal para a distribuição igualitária desse patrimônio entre os sócios.
Essa é uma diferença fundamental em relação às empresas tradicionais, onde os acionistas têm direito a receber uma parte do patrimônio remanescente em caso de liquidação da empresa. Nas cooperativas, a lógica é outra. O patrimônio remanescente não é considerado um lucro a ser distribuído, mas sim um recurso que deve ser destinado a fins sociais.
A Destinação Legal: Prioridade para Outra Cooperativa ou Instituição Semelhante
A Lei nº 5.764/71 estabelece que, em caso de dissolução, o patrimônio remanescente da cooperativa será destinado a outra cooperativa de igual natureza, ou, na impossibilidade, a uma instituição pública ou privada de caráter beneficente, sediada na mesma base territorial da cooperativa dissolvida.
Essa destinação do patrimônio remanescente reflete o princípio da intercooperação, que é um dos pilares do cooperativismo. Ao destinar o patrimônio para outra cooperativa, busca-se fortalecer o movimento cooperativista como um todo, garantindo que os recursos sejam utilizados para o desenvolvimento de outras iniciativas cooperativas.
Caso não seja possível destinar o patrimônio para outra cooperativa, a lei prevê a destinação para uma instituição pública ou privada de caráter beneficente. Essa destinação garante que os recursos sejam utilizados para fins sociais, beneficiando a comunidade onde a cooperativa estava inserida.
O Estatuto Social Pode Prever Outras Destinações
Embora a lei estabeleça a prioridade para outra cooperativa ou instituição beneficente, o estatuto social da cooperativa pode prever outras destinações para o patrimônio remanescente. Por exemplo, o estatuto pode prever a destinação de uma parte do patrimônio para a criação de um fundo de desenvolvimento cooperativo, ou para a realização de projetos sociais na comunidade.
É importante ressaltar que qualquer destinação diferente daquelas previstas na lei deve ser aprovada em Assembleia Geral, com o voto favorável da maioria dos sócios. Além disso, a destinação deve estar alinhada com os princípios do cooperativismo e com os objetivos da cooperativa.
Conclusão: O Espírito Cooperativista na Destinação do Patrimônio
Em resumo, o destino do patrimônio de uma cooperativa em caso de dissolução é um tema crucial para entendermos a essência do cooperativismo. Ao contrário das empresas tradicionais, onde o lucro é o objetivo principal, nas cooperativas o foco é o atendimento das necessidades dos membros e o desenvolvimento da comunidade.
Por isso, a legislação cooperativista brasileira não prevê a distribuição igualitária do patrimônio remanescente entre os sócios. Em vez disso, a lei estabelece que o patrimônio deve ser destinado a outra cooperativa de igual natureza, ou, na impossibilidade, a uma instituição pública ou privada de caráter beneficente.
Essa destinação reflete o espírito cooperativista, que valoriza a intercooperação, a solidariedade e o compromisso com o desenvolvimento social. Ao destinar o patrimônio para outras cooperativas ou instituições beneficentes, garante-se que os recursos sejam utilizados para fins sociais, beneficiando a comunidade e fortalecendo o movimento cooperativista como um todo.
Portanto, ao participar de uma cooperativa, é fundamental entender que o objetivo principal não é o lucro individual, mas sim o benefício coletivo. Em caso de dissolução, o patrimônio remanescente será destinado a fins sociais, em consonância com os princípios do cooperativismo.
Espero que este artigo tenha esclarecido suas dúvidas sobre o destino do patrimônio em caso de dissolução de cooperativa. Se você tiver mais perguntas, não hesite em entrar em contato. E lembre-se: o cooperativismo é uma forma de organização que valoriza a colaboração, a solidariedade e o compromisso com o desenvolvimento social.